***Vera passou o dia olhando para o relógio prateado em seu pulso. Como nada aconteceu, ficou de mal dele e passou a vigiar o relógio de parede, o que em nada resolveu. Chegou em casa mais cedo e se atrapalhou com o que tinha para fazer ali. Perdeu-se em si. Fez as contas mentalmente: se ele ligasse, sairiam às duas e voltariam por volta das cinco. Ela não saiu, ela não voltou. Estivera ali, com uma estranha ansiedade, pois nem sabia ao certo o que esperar. Quando o dia acabou, um aperto tomou seu lugar. Mas não foi ela que ligou contando a grande novidade para as amigas? Não foi ela que lembrou de cada detalhe sobre Maurício? Não foi ela que se maravilhou com cada bobagem dita? E agora silêncio. Uma peça de teatro em que a tola era ela, a palhaça, inimiga de si. Se ela ficasse bem quieta, poderia ouvi-lo dizer "te ligo depois", dito há dois dias. E as mensagens? Se orgulhava das suas, escrevia coisas bem humoradas, coisas bacanas. Mandou três e não teve resposta de nenhuma. Checou o aparelho, para verificar se estava bem configurado. Ligou para a operadora do celular, "a conta está paga mesmo? estranho, não estou recebendo mensagens..." Releu todas e não se arrependeu de nenhuma palavra. O que o afastou? O que ele viu demais? O que ele viu de menos?
Passou a imaginar coisas, no lugar do sonho que achou estar vivendo. Vera realmente acreditou que viajariam em julho, que ele a ouviria, que lhe daria atenção, colo e cafuné. Mas cadê? Nada, a caixa de e-mails cheia de power points e correntes e nenhuma palavra dele. O nada é pior que tudo? Ou a espera é a parte pior. Vera não sabia nem o que era pior nem nada sobre Maurício. Se pensasse bem talvez chegasse a conclusão que não sabia nada sobre si também. Tentou ser positiva, tomou um banho longo, se maquiou, se perfumou, colocou uma presilha diferente no cabelo..."se ele aparecer, me fazendo uma surpresa, estou preparada, só pode ser isso, ele quer me surpreender!". E viu os jornais, viu as novelas, viu a noite esbarrar na madrugada. Quando se convenceu a colocar um pijama sentiu como se jogasse a última pá de cal na sua vida amorosa. Se olhou no espelho e se viu triste e cansada. E vazia, incrivelmente vazia. Ligou para Maurício. A dúvida era maior que o orgulho próprio ou Vera não sabia para que serve um pouquinho de dignadade.
- Alô, Maurício?
-Oi.
-Oi, eu tava preocupada...você sumiu...
-Hã? Sumi como?
- Ah...você não mem ligou, fiquei esperando por você e...
- Mas quem está falando?
-Ninguém, Maurício. Ninguém.***
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